Uma fábula que nos avisa sobre o nosso futuro: ‘A Ilusão do Tempo’

Em resenha, a colaboradora do CORREIO analisa a obra de Andri Snær Magnason

Duas histórias em uma. Essa fábula nos avisa sobre o nosso futuro próximo em que queremos nos livrar do que não nos agrada e precisamos ter tempo para tudo, enquanto ignoramos o necessário.

Vemos na capa um emaranhado de desenhos e entendemos durante a leitura. No canto inferior direito há a placa TIMAX, essa empresa descobre como parar o tempo e oferece essa grande oportunidade aos clientes que desejam pular alguma parte indesejada de sua vida, como crises financeiras e fevereiros. E é muito útil para quem não tem paciência com o filho, basta largá-lo lá e esquecer de sua existência.

A Ilusão do Tempo (Tímakistan, Editora Morro Branco, 2017, 320 páginas), de Andri Snær Magnason, começa com a narrativa da vida de Vitória. Seus pais resolvem comprar as terríveis caixas pretas que prometem parar o tempo e fugir da grande crise econômica. Mas algo dá errado e quando a menina sai de seu abrigo tudo está mudado. A Natureza tomou conta de tudo. O menino Marcos surge e a leva até Rosa, a senhora passa a contar a história de um rei tirano e ganancioso que ama sua filha e decide conquistar o mundo para ela. Mas percebe que o tempo passa e sua filha envelhecerá.

A princesa Obsidiana é muito mimada. Ela recebia tanta atenção e cuidados que nem uma vez chegou sequer a ralar o joelho e descobrir a diversão de arrecadar a casquinha da ferida.

Doze anos depois, o rei Dímon volta de sua conquista e percebe o tempo perdido. Resolve dar metade do reino a quem descobrir uma forma de manter a juventude da princesa.

O rei acaba com a vida de muitos pelo simples fato de ninguém conseguir ajudá-lo. E, enquanto perde esse tempo precioso, ele podia ter ficado com a menina, que de nada sabe dos tristes planos do pai.

O livro remete a Momo e o Senhor do Tempo, de Michael Ende, as pessoas tinham todo o tempo do mundo, mas homens cinzentos chegam para mostrar que elas o desperdiçam com conversas e passeios e outras coisas legais. Assim Momo precisa ajudar todos a recuperarem suas antigas vidas.

Às vezes a narrativa volta para o mundo do futuro onde estão Vitória e Marcos, mas a maior parte segue a vida do rei e sua filha. Há muito tempo uma história não me prendia dessa forma. Devorei e, como acontece com os bons livros, queria mais. Duas histórias fantásticas que se complementam. Um livro visualmente convidativo, bem escrito e desenvolvido.

Andri Snær Magnason ganhou diversos prêmios, incluindo uma citação no Philip K. Dick Award, em 2016 concorreu à Presidência da Islândia! Aqui nos presenteia com uma história incrível, para crianças e adultos. Há bastante crítica ao mundo de consumo desenfreado, às pessoas que não têm tempo para seus filhos e apenas querem manter suas vidas socialmente perfeitas. O egoísmo prevalece no mundo adulto. O autor não entrega uma história mastigada aos seus leitores, ele os convida a pensar.

A Ilusão do Tempo é uma fábula de amor e amizade, também de muito egoísmo, tempo perdido e tempo guardado. Tudo dentro de uma história de amor e amizade e assim segue…

 

******Heidi Gisele Borges é autora dos livros juvenis O menino que perdeu a magia e Um segredo de Natal e de diversos contos de horror sob o nome Celly Borges. Escreve resenhas também na revista Mestres do Terror, no jornal Em Foco, de Brusque (SC), e no site becodonunca.com.br.