Dia Internacional da Mulher: escritos de Carolina Maria de Jesus em destaque

Nesta terça-feira (8), Dia Internacional da Mulher, é importante rememorar a trajetória emblemática de Carolina (1914-1977), uma migrante mineira que morava na favela do Canindé (SP) junto com seus filhos, em meio à pobreza e sujeira

Carolina Maria de Jesus. Negra, mulher, pobre. Sua história está registrada de maneira tortuosa (em primeira pessoa) no livro “Quarto de despejo: Diário de uma favelada”, que foi publicado em 1960.

Nesta terça-feira (8), Dia Internacional da Mulher, é importante rememorar a trajetória emblemática de Carolina (1914-1977), uma migrante mineira que morava na favela do Canindé (SP) junto com seus filhos, em meio à pobreza e sujeira. Principalmente porque, de uns anos para cá, sua obra vive um processo de redescoberta.

Inclusive, o trabalho de Audálio Dantas (1929-2018) – o jornalista que descobriu os diários da autora quando fazia uma reportagem sobre a favela, ao final dos anos de 1950 – passa por revisionismo. Como ele editou o texto original, acabou suprimindo parte do material.

Nesse sentido, a editora Ática, que detém os direitos autorais até 2026, publicou em 2022 textos originais escritos por Carolina à época de “Quarto de despejo”, diferentes daqueles que foram selecionados por Dantas. Alguns trechos publicados em “Páginas despejadas” são totalmente inéditos.

A proposta do responsável pelo livro, o historiador José Carlos Sebe Bom Meihy, é oferecer uma seleção distinta de Dantas – já que Carolina escreveu mais de 50 mil linhas de diários e a edição tradicional aproveitou cerca de 8.800. O primeiro volume da trilogia apresenta inéditos do diário de Carolina, cobrindo de 15 a 28 de julho de 1955 e 18 de maio a 29 de junho de 1960.

Mas a versão editada pelo jornalista, que descobriu os “vinte cadernos encardidos” de Carolina em 1958, continua em circulação pela Ática para quem quiser conhecer. Por meio de uma linguagem simples e original, a autora conta o dia a dia paupérrimo e sofrido de uma catadora de papel na favela, ao lado de seus três filhos.

Em tempo: nos anos de 1960, a Favela do Canindé foi desocupada para a construção da Marginal do Tietê.

Livro editado por Audálio Dantas é a versão clássica (Foto: Reprodução)

ALVENARIA
Outra perspectiva sobre Carolina Maria de Jesus é o momento pós-favela, quando ela conseguiu comprar a tão sonhada casa de alvenaria, em Santana, onde viveu antes de se mudar para um sítio em Parelheiros.

Em 2021, a editora Companhia das Letras lançou dois volumes de uma nova série que publicará os diários integrais da autora.

O primeiro livro, “Casa de alvenaria – Volume 1: Osasco”, registra os meses em que a escritora morou em Osasco (SP), em 1960. Edição ampliada e integral, com conteúdo inédito e introdução de Conceição Evaristo e Vera Eunice de Jesus. Através deste testemunho precioso que borra as fronteiras dos gêneros literários, acompanhamos a recepção de “Quarto de despejo”, as viagens de divulgação, o contato frequente com a imprensa e os políticos, o desenvolvimento de seu projeto literário e seu desejo de ser reconhecida como escritora. Dessa narrativa do cotidiano, entremeadas às contradições de seu tempo, emergem reflexões que permanecem mais atuais do que nunca.

Já o segundo livro, “Casa de alvenaria – Volume 2: Santana”, inclui diários que se estendem até dezembro de 1963, com conteúdo inédito ou fora de circulação há décadas. Através desses registros, acompanhamos a nova vida de Carolina, a movimentação em sua casa, as viagens e, sobretudo, a dificuldade de transpor as barreiras do racismo e da estigmatização para ser reconhecida como escritora.

LIVRO
Organizado por Denise Gabriel Witzel e Níncia Cecilia Ribas Borges Teixeira, professoras do campus Santa Cruz em Guarapuava da Universidade Estadual do Centro-Oeste (Unicentro), o livro “Quarto de despejo: olhares sobre a obra de Carolina de Jesus” (ed. UEPG, 2018) apresenta um conjunto de artigos escritos por pesquisadores que “tomam a obra de Carolina Maria de Jesus como um importante referencial discursivo, cultural e literário, na medida em que sua obra é atualíssima e um expoente de resistência”.

HQ
Na HQ “Carolina” (ed. Veneta, 128 páginas), João Pinheiro e Sirlene Barbosa contam a história de Carolina Maria de Jesus: a infância pobre da escritora em Minas Gerais, sua vida sofrida em São Paulo, a fama, as ilusões, as decepções e o esquecimento.

A história de luta, fama e declínio de umas das mais marcantes vozes femininas da literatura brasileira está nesta biografia em quadrinhos, que narra sua infância pobre em Minas Gerais, sua vida sofrida em São Paulo, a fama, as ilusões, as decepções e o esquecimento.

Essa HQ da Veneta foi finalista do Prêmio Jabuti 2017.

(Foto: Reprodução)

AUTORA
Carolina Maria de Jesus nasceu em 1914, em Sacramento (MG), mas viveu boa parte de sua vida na cidade de São Paulo – na favela do Canindé, em Santana e em Parelheiros. Com a publicação de “Quarto de despejo” (1960), que reunia fragmentos de seus diários sobre a vida na favela, ganhou projeção nacional e internacional.

Em vida, lançou ainda “Casa de alvenaria” (1961), “Pedaços da fome” (1963) e “Provérbios” (1963). Morreu em 1977, aos 62 anos, em decorrência de uma crise de asma, deixando uma vasta obra composta pelos mais diversos gêneros literários, parte da qual ainda permanece inédita.

Deixe um comentário