Existe mercado para todo tipo de jornalismo, avalia Katia Brembatti

Presidente da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) e uma das editoras do jornal O Estado de S.Paulo, a jornalista participou da abertura do Intercom Sul 2023 em Guarapuava, no campus Santa Cruz da Unicentro

Jornalista paranaense premiada e experiente, Katia Brembatti participou do painel de abertura do Intercom Sul 2023 em Guarapuava, nesta quinta-feira (8), no campus Santa Cruz da Universidade Estadual do Centro-Oeste (Unicentro).

Atualmente, ela é presidente da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) e uma das editoras do jornal O Estado de S.Paulo. Uma das passagens marcantes de sua carreira foi ter participado da equipe de investigação da série “Diários Secretos”, um divisor de águas no Paraná.

Em entrevista ao CORREIO, Brembatti avalia que hoje, do ponto de vista de sustentabilidade financeira, há espaço para todo tipo de jornalismo, citando, por exemplo, iniciativas com financiamento de fundações ou editais de fomento. Não existe somente a figura do repórter assalariado, sendo possível fazer freelancers (pago por matéria).

“O que existe é o jornalista que se prepara, continua se informando, buscando formas de atuação”, diz, elencando também gente que aborda assuntos que antes não eram vistos na cobertura tradicional.

Há duas semanas, Brembatti esteve em São Paulo, dando treinamento para comunicadores de periferia. Segundo ela, um sujeito da Zona Leste da Capital resolveu fazer um podcast sobre a ZL. “Essa realidade não estava sendo coberta pela imprensa. Agora, ele vai cobrir”.

Ou seja, hoje existe mais opções de veículos de comunicação do que nos anos de 1990 ou 2000, por exemplo. “Porque hoje é muito mais barato fazer jornalismo”, afirma a jornalista, destacando as mídias alternativas, independentes, e gente fazendo jornalismo nas suas comunidades.

De fato, ela reconhece que houve enxugamento nas grandes Redações, com demissões em massa e precarização das condições de trabalho. “Mas a gente precisa olhar para essas novas iniciativas que não existiam e passaram a existir nos últimos dez anos”, abrindo um leque de áreas de atuação para o repórter.

Foto: Cristiano Martinez/Correio

JORNALISMO PROFISSIONAL
Sobre o jornalismo profissional, que se torna cada vez mais difícil, Katia Brembatti avalia como sendo um ciclo. “A gente passou por um processo de desvalorização. E agora a gente vai começar um processo de valorização”.

Nesse sentido, a presidente da Abraji analisa que esse cenário de múltiplos comunicadores, caso dos influencers no YouTube, muitas vezes sem técnica ou ética, tem seus pontos positivos e negativos. Mas vai chegar num ponto em que as pessoas vão questionar de onde veio a informação, quem é o financiador, se a publicação é feita da maneira correta etc.

“Eu acho que a gente vai virar essa roda em algum momento e vai voltar ao processo de valorização daquele profissional, que não vou chamar de ‘tradicional’, mas faz a apuração correta, que se preocupa com o resultado daquele conteúdo, que tem uma formação jornalística. Eu acredito nisso”.

INVESTIGAÇÃO
Em 2010, um esquema de desvios de dinheiro público, na Assembleia Legislativa do Paraná (Alep), começou a ser revelado, numa produção em parceria da RPC TV com o jornal Gazeta do Povo. A série ficou conhecida como “Diários Secretos” e uma das repórteres da equipe investigativa era Brembatti.

Ela conta que, para essa apuração vir à tona, foi necessária uma soma de fatores, numa época em que ainda precisava pesquisar em documentos impressos. “Esse caso é tão emblemático para o Paraná porque nunca tinha sido feito nada parecido antes. Acredito que não foi feito nada parecido depois. Mas era bem um processo de transição da internet”, exemplificando que, naquele momento, o Diário da Assembleia ainda não estava na web, ou seja, a investigação foi feita toda de maneira analógica, em papel.

Mas ela evita ser saudosista, pois acredita que hoje a produção de matérias investigativas é feita com qualidade e em veículos consolidados, que mantêm equipes dedicadas a apurar. A jornalista cita, por exemplo, o jornal O Estado de S.Paulo, que tem um núcleo investigativo ao estilo do Spotlight (famosa equipe de jornalismo do jornal The Boston Globe).

“Esses recursos tecnológicos que a gente tem hoje permitem que as investigações sejam mais rápidas”, diz.

INTERIOR
Segundo a presidente da Abraji, o calcanhar de Aquiles da cobertura jornalística ainda é o interior do país, onde imperam os chamados “desertos de notícias”, ou seja, em cidades sem nenhum veículo de comunicação, ou que são acanhados, dependentes do poder público.

Enquanto nas capitais os repórteres ficam de olho no governo federal, por exemplo, em cidades menores a cobertura é precária em relação ao serviço público de prefeituras e câmaras.

Com mediação de Ariane Pereira (à esq), painel contou com a participação de Ivan Mizanzuk, do podcast sobre o Caso Evandro (Foto: Cristiano Martinez/Correio)

TRAJETÓRIA
Katia Brembatti é jornalista formada pela Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG). Trabalhou como repórter na Gazeta do Povo e desde 2013 é professora de Jornalismo na Universidade Positivo.

Com a série “Diários Secretos”, juntamente com três colegas, venceu o Grande Prêmio Esso, o Tim Lopes de Jornalismo Investigativo/Embratel, o Prêmio Ipys de reportagem investigativa da América Latina e o Global Shining Light Award.

Com atuação nas áreas de cobertura de meio ambiente e Judiciário, Brembatti venceu o prêmio SOS Mata Atlântica e o da Associação dos Magistrados do Brasil.

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