Editora Tinta-da-China Brasil retorna ao mercado livreiro

Crônica, contos e ensaio de história estão na primeira fornada de lançamentos sob gestão da Associação Quatro Cinco Um

Está de volta às livrarias uma das mais inventivas e singulares editoras do país: após um hiato de cerca de dois anos, a Tinta-da-China Brasil volta a lançar e reimprimir livros, agora sob administração da Associação Quatro Cinco Um, organização sem fins lucrativos voltada para a difusão do livro, da língua portuguesa, da literatura e do pensamento científico no país.

Editora independente criada em Portugal em 2005, em 2012 a Tinta-da-China ganhou uma irmã brasileira, com sede no Rio de Janeiro. Dez anos e quase cinquenta títulos depois, a editora brasileira foi doada por sua fundadora, Bárbara Bulhosa, à Associação Quatro Cinco Um. A editora se soma aos outros projetos realizados pela instituição: o festival de editoras A Feira do Livro, que teve a sua primeira edição em junho, no Pacaembu, em São Paulo, e a revista de crítica de livros Quatro Cinco Um, publicada desde 2017.

Além de trazer para o Brasil o melhor do catálogo da Tinta-da-China portuguesa, a casa brasileira também vai criar e lançar novos livros, de autores de todas as origens, mantendo o padrão editorial e gráfico que pôs a editora de Bulhosa entre as mais importantes de Portugal.

A primeira fornada de livros traz uma amostra desse espírito e inclui literatura — um best of do cronista Ricardo Araújo Pereira e um volume de contos sobre a bomba de Hiroshima, de Tamiki Hara — e não ficção: crônicas do colunista da Quatro Cinco Um Paulo Roberto Pires sobre a ascensão da extrema direita no país e um ensaio de Rui Tavares sobre o Terremoto de Lisboa em 1755 e seus desdobramentos históricos.

Diante do fascismo: crônicas de um país à beira do abismo, de Paulo Roberto Pires, tem prefácio do jornalista Bob Fernandes. O livro de RAP, Estar vivo machuca: as melhores crônicas de Ricardo Araújo Pereira, tem seleção de Gustavo Pacheco e apresentação de Tati Bernardi. O pequeno livro do Grande Terremoto, de Rui Tavares, ganhou em sua edição brasileira um flipbook na margem direita das páginas ímpares que anima uma gravura do século 18 que mostra pessoas fugindo do terremoto.

CATÁLOGO

Se esses livros refletem algumas das linhas de força da editora, vale a pena conhecer um pouco do que foi publicado até agora pela Tinta-da-China Brasil.

A editora trouxe para o Brasil clássicos lusos ainda pouco conhecidos no Brasil, na coleção Grandes Autores Portugueses (Agustina Bessa-Luís, Antero de Quental, Sophia de Mello Breyner Andresen, Mário de Sá-Carneiro, Eduardo Lourenço), contemporâneos de destaque na cena literária portuguesa (Dulce Maria Cardoso, Pedro Mexia, Valério Romão, Alexandra Lucas Coelho, Ricardo Araújo Pereira) e também a mais bela coleção de Fernando Pessoa, com coordenação de Jerónimo Pizarro, o principal especialista no estabelecimento de texto do poeta português.

Gustavo Pacheco, que recebeu o prêmio Machado de Assis da Biblioteca Nacional pelos contos de Alguns humanos, é o editor brasileiro da Granta em Língua Portuguesa, ao lado de Pedro Mexia (do outro lado do oceano), e vai atuar também como editor “at large” de livros de literatura, como a recém-publicada seleção das crônicas de Ricardo Araújo Pereira.

Joana Gorjão Henriques, com Racismo em português, e o angolano Luaty Beirão, com Sou mais livre então, nos dão notícias da luta anticolonialista e contra o autoritarismo nas antigas possessões portuguesas na África. A história do fascismo, na Europa e em outras partes, é uma tônica na linha editorial.

Toques de humor marcam o catálogo: além de três livros de um dos maiores humoristas da atualidade, Ricardo Araújo Pereira, a editora publicou o divertido e curioso manual satírico O pauzinho do matrimónio: a arte de gozar e fazer gozar, de autoria do grande ceramista Rafael Bordalo Pinheiro, e Levante-se o réu, crônicas em que Rui Cardoso Martins lança um olhar literário para as audiências da primeira instância da Justiça portuguesa.

As edições da Tinta-da-China são reconhecidas por serem confiáveis para uso de estudantes e especialistas e ao mesmo tempo agradáveis para os olhos e para as mãos. Quase todos os livros são assinados por Vera Tavares, designer portuguesa que desde as primeiras edições criou a identidade gráfica da Tinta-da-China, marcada pela elegância e pela graça, num efeito ao mesmo tempo clássico e moderno. Verá continuará a produzir capas e projetos para a irmã brasileira da Tinta-da-China, como a coletânea de crônicas de Paulo Roberto Pires.

Foto: Reprodução

LANÇAMENTOS
A editora volta à produção inaugurando também um novo espaço na internet. O recém-lançado site da Tinta-da-China Brasil traz a opção de comprar, além dos livros novos, exemplares usados, isto é, com pequenos desgastes e imperfeições, com 50% de desconto.

O lançamento mais recente, Flores de verão, reúne contos do escritor japonês Tamiki Hara, que sobreviveu à bomba de Hiroshima por estar no banheiro no momento da explosão. O livro foi lançado no dia 6 de agosto, data que marcou os 77 anos da tragédia.

Os próximos lançamentos incluem uma nova edição da revista Granta em Língua Portuguesa, com o tema Rússia, e livros sobre a história da língua portuguesa, sobre o salazarismo, o sebastianismo e, evidentemente, Fernando Pessoa, preenchendo lacunas na bibliografia de temas essenciais para o leitor brasileiro.

Nos próximos meses, passa a integrar o catálogo da editora Assim nasceu uma língua: sobre as origens do português, de Fernando Venâncio, que vai tocar no tema do bicentenário da Independência do Brasil pela perspectiva da língua portuguesa.

EQUIPE
A equipe interna será composta pela editora e historiadora Paula Carvalho, a assistente editorial Ashiley Calvo e as designers Isadora Bertholdo e Giovanna Farah. Também participam a diretora executiva Mariana Shiraiwa, a coordenadora de comunicação Gabriela Valdanha, a assistente de atendimento Ana Carolina Gomes e o assistente comercial Leandro Valente. Beatriz Muylaert e a designer Paula S. Carvalho coordenaram o desenvolvimento do novo site.

Alguns humanos, Gustavo Pacheco
Livro de estreia que revelou um autor maduro e original, já em plena posse de sua arte. Os contos de Alguns humanos venceram o Prêmio da Biblioteca Nacional em 2018 e estão entre os destaques da narrativa breve contemporânea em língua portuguesa.

Ricardo Araújo Pereira
Os leitores de RAP nos jornais e revistas sabem que Ricardo é hoje um dos mestres da crônica, gênero que parecia ser exclusivamente brasileiro. Isso fica demonstrado nos três livros de Ricardo que a Tinta-da-China Brasil já publicou até agora: duas antologias de crônicas e um manual de escrita humorística.

Foto: Reprodução

COLEÇÃO FERNANDO PESSOA
Sempre aparecem coisas novas a descobrir na obra de Fernando Pessoa, e as edições da Tinta-da-China, sob coordenação do maior especialista no poeta, Jerónimo Pizarro, levam os leitores para dentro do universo de Pessoa e para a força de sua escrita.

Com sete volumes já publicados, a editora prepara projetos ousados em torno de Pessoa, sob a coordenação de Pizarro, que vai publicar seu estudo Ler Pessoa pela Tinta-da-China Brasil. Pizarro também organizou, com Carlos Pittella, o divertido manual de autoajuda Como Fernando Pessoa pode mudar a sua vida, no qual o leitor aprende, por exemplo, que o poeta criou o slogan da Coca-Cola em Portugal e inventou um jogo de tabuleiro parecido com o atual War.

Granta em língua portuguesa
Desde 2018, a mais prestigiosa revista literária do planeta – fundada em 1889, no Reino Unido – ganhou uma edição pela Tinta-da-China que uniu as antigas Granta Brasil e Granta Portugal. Em formato de livro, a Granta em língua portuguesa é o espaço de fermentação de novas escritas, de novas gerações de autores e da presença dos grandes escritores internacionais, sob os cuidados dos editores Gustavo Pacheco (Brasil) e Pedro Mexia (Portugal).

Foto: Reprodução

GRANDES AUTORES PORTUGUESES
A literatura portuguesa é bem mais vasta do que se estuda no Brasil nos tempos do vestibular. Ensaio e poesia do mais alto nível são os pilares desta bela coleção, que interroga sobre as identidades culturais entre Brasil e Portugal e reúne um repertório de peso a ser descoberto ou redescoberto, com Agustina Bessa-Luís, Sophia de Mello Breyner Andresen, Herberto Helder, Antero de Quental e Mário de Sá-Carneiro.

Literatura portuguesa contemporânea
Valério Romão, Dulce Maria Cardoso, Alexandra Lucas Coelho, Almeida Faria – os grandes autores da ficção portuguesa contemporânea em Portugal estão na Tinta-da-China Brasil. Autores como Rui Cardoso Martins, Pedro Mexia e Ricardo Araújo Pereira mostram que a arte da crônica não é mais uma exclusividade brasileira.

HISTÓRIA DE PORTUGAL
Fundada por Bárbara Bulhosa e seus colegas da faculdade de história, a Tinta-da-China renovou a bibliografia em torno de momentos chave do passado português e publicou edições que despertaram o interesse do público por temas antes restritos aos especialistas.

No Brasil, a Brevíssima história de Portugal, de A. H. de Oliveira Marques, e O pequeno livro do Grande Terremoto, de Rui Tavares, são alguns dos grandes sucessos da editora. Sebastianismo, salazarismo e história do fascismo na Europa estão entre os temas dos livros já contratados, preenchendo lacunas bibliográficas nas universidades brasileiras.

A Associação Quatro Cinco Um tem direção dos jornalistas e editores Paulo Werneck e Humberto Werneck.

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