Os anos de inventividade do terror nacional

Idealizado pelo coordenador da Gibicon e sócio da ZnorT! Fabrizio Andriani, o projeto de financiamento coletivo ‘Margem Negra’ capta pelo site Catarse o valor de R$ 21 mil para produzir um álbum histórico que reúne as histórias produzidas pela dupla Gian/Bené nos anos de 1980/90. Com o passar do tempo, o material se tornou um clássico do quadrinho nacional de terror.

À época, tanto Gian Danton (roteiro) quanto Bené Nascimento (desenhos) estavam em início de carreira, na longínqua região Norte do Brasil. Mais tarde, Gian se tornaria um dos mais premiados roteiristas de gibis, com livros sobre a técnica e pesquisas acadêmicas; e Bené passaria a se chamar Joe Bennett, um prestigiado artista da Marvel e da DC Comics, com trabalhos ligados a Alan Moore.

Os gibis produzidos no início da carreira de ambos se fixariam na memória do quadrinho nacional, despertando o interesse de antigas e novas gerações de leitores. Mas as histórias ficariam décadas longe do mercado editorial, permanecendo praticamente perdidas em acervos pessoais e de instituições como a Gibiteca de Curitiba. Graças ao projeto, todo esse material pode vir à luz e retornar, pela primeira vez, em um livro que se chamará ‘Margem Negra’.

Andriani conta que a ideia de recuperar as narrativas criadas pela dupla Gian/Bené nasceu durante uma exposição em homenagem a Joe Bennett, em 2007, na capital paranaense. Comemorando os 25 anos da Gibiteca de Curitiba, o evento reuniu artes originais do desenhista. O Joe veio pela primeira vez a Curitiba. Durante sua visita, ele acabou encontrando suas primeiras histórias nas revistas de terror publicadas entre o final dos anos 80 e meados dos 90, destacando que, ao ver aquele material, Bennett se emocionou com o estado dos gibis, que estavam literalmente se perdendo e se deteriorando.

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Ao lado da coordenadora da Gibiteca de Curitiba, Maristela Garcia, o roteirista Gian Danton olha uma arte original de Joe Bennett (Bené Nascimento)

Para evitar o fim das revistas, surgiu a ideia de reuni-las em uma edição especial, cuja primeira tentativa de publicação não vingou em 2009. O projeto foi engavetado, após termos juntado boa parte do material graças à ajuda de alguns fãs e do mítico editor paulistano Franco de Rosa, que encontrou algumas pérolas únicas e raríssimas.

No entanto, em 2015 veio a ideia de fazer a compilação do material por meio de uma ‘vaquinha virtual’, expediente muito comum hoje em dia para tirar do papel projetos de CDs, gibis, livros e até mesmo festivais. O idealizador explica que, por enquanto, a ideia do ‘Margem Negra’ é restaurar e republicar 12 histórias feitas pela dupla Gian/Bené; uma delas será inédita e feita exclusivamente para o álbum de luxo.

Os originais dessas páginas [da história inédita] vão estar entre as recompensas (mais cobiçadas) no Catarse! Se atingirmos as metas estendidas, vamos colocar mais duas histórias e capa dura.

GIAN DANTON
Para o roteirista, pesquisador e escritor Gian Danton, o projeto ‘Margem Negra’ é a realização de um velho sonho. Por anos, achei que esse material se perderia. Essas histórias marcaram uma época, não só para mim e para o Bené, mas para fãs e quadrinistas. Muita gente chega comigo e diz que começou a fazer quadrinhos porque lia essas histórias.

No entanto, Gian sabe que a empreitada não será nada fácil, já que parte do material produzido nos anos de 1990 está em péssimas condições. Por exemplo, a história ‘O Puritano’ talvez nem entre porque o restauro vai ser monstruoso, ratificando a informação de Andriani sobre o garimpo feito na Gibiteca, fãs e no acervo de Franco.

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Uma prévia de como ficará a capa do álbum de luxo ‘Margem Negra’. A ilustração foi feita especialmente por Joe Bennett

Se tudo der certo quanto ao financiamento do projeto, Gian adianta que o livro terá, além das histórias clássicas e do material inédito, um texto introdutório com curiosidades, meio biografia das duplas. E antes de cada HQ, um texto meu contando como foi o processo criativo, curiosidades relativas àquela história etc..

TERROR NACIONAL
Além de roteirista e escritor, Gian também é pesquisador da Nona Arte, com livros publicados sobre produção de roteiro e material desenvolvido entre os muros da universidade.

Em sua avaliação, o quadrinho de terror nacional não tem mais a mesma força que teve nos anos de 1990. Na minha época, [Alan] Moore e [Neil] Gaiman estavam revolucionando o terror, que antes era antiquado e à na época era visto como vanguarda. Nós trouxemos isso para o Brasil. Hoje parece que os fãs acham que o terror é coisa do passado.

Segundo ele, a queda de popularidade do terror é culpa principalmente dos editores, que cometeram muitos erros e fizeram com que o gênero tivesse queda de vendas nos quadrinhos. Exemplo disso é o nosso próprio trabalho, que ficou disperso em várias revistas. No início, os editores não queriam publicar, mesmo vendendo bem, porque achavam um conteúdo muito pesado.

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Justiça seja feita, o único editor que acreditou integralmente na dupla com Bené, segundo Gian, foi o Franco de Rosa. O profissional publicou quase tudo que eles produziam e deu total liberdade. Maior prova disso é ‘O Puritano’, que misturava terror com super-herói. Ninguém quis publicar porque fazia essa mistura de gêneros. Enquanto isso, nos EUA isso era normal e fazia sucesso, a exemplo de John Constantine, finaliza.

COMO COLABORAR
Qualquer pessoa pode apoiar o projeto ‘Margem Negra’. O prazo da campanha se encerra no dia 18 de setembro e precisa arrecadar pelo menos R$ 21 mil. O valor é única e exclusivamente para cobrir despesas com gráfica, Correios, pôsteres, produção da campanha, tratamento das páginas e porcentagem do Catarse.

Lembrando que quanto maior a contribuição, melhor é a recompensa.

– Acesse o site do projeto no Catarse;

– Leia sobre o projeto e as recompensas;

– Clique em uma das contribuições, com valores a partir de R$ 10;

– Pronto. Apoio registrado. Agora é só aguardar a entrega das recompensas.


Texto: Cristiano Martinez
Fotos: Arquivo Pessoal e Divulgação

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