‘Carro de som’, uma tradição presente em Guarapuava
Mesmo na era das redes sociais, o ‘carro de som’ ainda é utilizado para propagandas e anúncios
É impossível não notar. Principalmente pelo barulho e pela velocidade no trânsito. Reverberando nas ruas centrais ou nos bairros, aqueles famosos carros de som anunciam promoções, lojas e até mesmo a chegada de um circo.
Mesmo na era das redes sociais, a tradicional comunicação itinerante desses veículos ainda é presença marcante em cidades como Guarapuava. Não importa o modelo de automóvel, o principal é que a mensagem chegue aos espectadores em qualquer lugar.
Uma das vozes mais conhecidas na terra do lobo bravo é a do radialista Jorge Oscar Nunes (63 anos), que trabalha com carro de som há 30 anos na região. Ele chega a percorrer 100 quilômetros de ruas da cidade em um dia com oito horas de serviço. Multiplicando essa distância diária pelo tempo de experiência, seu carro já espalhou o som de diversos anúncios por mais de um milhão de quilômetros. A carreira de radialista começou há 45 anos e atualmente ele equilibra as duas funções.
Nós descobrimos que era necessário outro veículo de comunicação que pudesse oferecer uma nova opção de divulgação, principalmente para o comércio da cidade, comentou sobre o início do trabalho com carro de som. Segundo ele, o pioneiro deste serviço em Guarapuava foi seu irmão Chico Nunes.
EMPRESAS
A assessoria da Prefeitura informou que atualmente existem dez empresas de carro de som regulamentadas no setor de alvarás.
Uma dessas dez empresas é a fonte de renda do empreendedor Braz de Deus dos Santos (43 anos) que também já trabalhou como locutor de rádio. Braz saiu de Irati em busca de trabalho em Guarapuava e foi locutor de um supermercado antes de trabalhar em uma rádio da cidade. Posteriormente, o locutor recebeu ajuda de um amigo para montar seu próprio negócio, um estúdio de áudio, onde ele grava propagandas para outros meios de comunicação.
A pequena empresa também faz locação de som e iluminação. Já o serviço de carro de som começou há oito anos com um veículo Gol ano 90 e agora ele dirige uma Fiorino, que também serve para transportar os instrumentos de locação. Braz acredita que o salário de uma rádio não conseguiria cobrir seu lucro com a soma dos serviços oferecidos pela empresa. É difícil encontrar um patrão que também é seu amigo, outra vantagem para ele em ser autônomo.
CIDADES
Os dois motoristas já foram para outras cidades da região, dentre as quais Palmital, Pitanga, Pinhão e Turvo. Segundo Jorge, o carro de som é repudiado. Muitas pessoas viram a cara, torcem o nariz e gesticulam quando passa um ‘carro de som’, relatou. A baixa velocidade em que dirigem é criticada. Quando estamos no Centro o pessoal costuma atribuir a lentidão do trânsito ao carro de som, disse Braz.
Quanto ao volume do som, os dois alegam respeitar as normas, colocando um som mais baixo para o Centro do que para os bairros e inclusive tomando o cuidado de diminuir o volume em vias próximas a escolas e hospitais. A Prefeitura define que durante o dia o som não deve ultrapassar os 65 decibéis e durante a noite o limite cai para 55 decibéis. A Polícia Militar é responsável pela fiscalização porque o volume excessivo se trata de perturbação do sossego.
PACIÊNCIA
A ouvidoria da Prefeitura não registrou nenhuma reclamação de carro de som nos últimos dois anos. Jorge e Braz nunca se envolveram em um acidente de trânsito, mas o radialista pede por mais paciência no trânsito. Eu acredito que hoje em dia todo mundo identifica o que é um carro de som, ponderou. Braz destacou que tudo precisa de tolerância. Sempre que possível a gente dá lado, para ou chega até estacionar para a pessoa passar.
NEGOCIAÇÃO
As negociações entre os anunciantes e os motoristas definem quantas horas os carros irão circular, em quais ruas e por quantos dias. Jorge e Braz produzem eles próprios uma nova narração caso a empresa não possua um áudio pré-estabelecido, mas ambos também reproduzem jingles e locuções que recebem já definidos pela empresa. Segundo eles, a procura mais recorrente é por lojas em feirão que querem anunciar as ofertas.
O proprietário de uma rede de supermercados de Guarapuava, Wilmar Millfrath (62 anos), anuncia em carros de som desde 2002, uma opção que é tradição. Através do carro você consegue avisar as pessoas que estão nas casas e na rua. Dá um enfoque mais direto no consumidor. O supermercado também anuncia em jornal, rádio e internet.
INUSITADO
O anúncio mais inusitado que o Jorge já fez foi para um idoso que queria encontrar a esposa. A mulher saiu do interior do município para fazer compras na cidade e ainda não havia retornado depois de três dias. Foram quatro horas falando o nome da mulher e avisando que seu marido estava a sua procura, hospedado em um hotel de Guarapuava. Eu achei hilário e ao mesmo tempo seríssimo, relatou o radialista que não soube do desfecho da história.