Um homem caído no chão

‘O ônibus vomita pessoas… Aos chutes o corpo anda. Que culpa tinha este cristão? Todos atônitos com seus anseios bradam “liberem a rua!’

Há um homem caído no chão. Quem se importa? Bala ao peito. Sangue pintando a calçada. Um sonho estendido no chão, uma esperança… Em casa filhos riem inocentes. Um sonho desenha no piso sua silhueta. Mas quem se importa? Todos passam apressados, resignam-se com a lentidão do trânsito, com a ignóbil figura, raquítica, de mãos encouraçadas, de mochilas nas costas, com sua térmica quebrada, marmita com um resto de comida dando nojo nos transeuntes. Envergonha-lhes. O ônibus vomita pessoas… Aos chutes o corpo anda. Que culpa tinha este cristão? Todos atônitos com seus anseios bradam liberem a rua! já é hora de minha novela. Logo começa o jornal. Todos seguem… A chuva cai e lava o sangue… Lava a discreta cal que ainda permeia nas mãos de nosso pitoresco herói. O corpo está só. Jogado à rua em frente à igreja. Ouvem-se primeiras cantigas cantadas pelas beatinhas, pontualíssimas às sete horas da noite… O sino toca… A plateia canta animada o canto de acolhida. Uma criança desobedece a mãe e sai correndo na chuva levando em suas pequeninas mãos um cartãozinho com o retrato de Nossa Senhora do Guadalupe. Ela para tristemente em frente àquele moribundo corpo, deposita em suas mãos a santinha. A mãe preocupada com a filha, dissipa-lhe qualquer vestígio de realidade, grita quase que desesperada agarrando a mão da pequenina venha aqui filha o titio já sara! A criança olhando para trás joga um singelo beijo àquela figura. A celebração continua calorosa.

 

******Marcio J. de Lima é aprendiz de poeta e contador de histórias, além de blogueiro