Cinema, história e faroeste no novo Tarantino
Em cartaz no circuito comercial de Guarapuava, “Era uma vez… em Hollywood” (2019) é o novo longa-metragem de Quentin Tarantino. Famoso por obras como “Pulp Fiction”, o diretor produziu seu filme mais emotivo e singelo
Desde que Pulp Fiction – Tempo de Violência (1994) estourou nos cinemas, tornou-se comum falar em assistir a um Tarantino toda vez que uma nova produção do diretor Quentin Tarantino chega ao mercado de exibição.
É com essa expectativa que muita gente tem saído de casa para conferir o novo Era uma vez… em Hollywood (2019), longa-metragem em cartaz por todo o Brasil – inclusive em Guarapuava (sessões às 16h, 19h e 21h40).
Para quem não sabe, o enredo do 9º filme de Quentin Tarantino se passa na Los Angeles de 1969, onde o ator Rick Dalton (Leonardo DiCaprio) está com sua carreira em declínio. A indústria do entretenimento da época não tem mais espaço para suas peripécias no gênero do western. E nem para seu inseparável dublê Cliff Booth (Brad Pitt).
Por isso, Dalton passa a trabalhar como vilão em produções menores, indicando que o seu caminho será o inevitável ostracismo. Mesmo com a oportunidade de filmar na Itália, estrelando películas do gênero western spaghetti, o ator tenta queimar os últimos cartuchos em Hollywood.
Em meio às andanças da dupla Dalton/Booth, Tarantino costura personagens baseados em figuras históricas, como é o caso do charlatão Charles Manson e do casal Sharon Tate (atriz)/Roman Polanski (diretor). Além, claro, das referências a filmes, programas de TV e lugares que marcaram a paisagem cultural norte-americana daquele momento.
FÁBULA
Apontado como o filme mais emotivo de Quentin Tarantino, Era uma vez… em Hollywood ambienta os espectadores em uma espécie de fábula (note o era uma vez no título da produção) sobre o fim de uma fase ingênua no cinema norte-americano.
Os faroestes preto no branco de Rick Dalton não atendem mais as expectativas da geração hippie que acendia nos Estados Unidos. No lugar de heróis quadrados e vilões caricaturais, o público queria mais ambiguidade.
Não por sinal, o ano de 1969 viu a chegada de Meu Ódio Será Sua Herança (1969), um faroeste dirigido por Sam Peckinpah que explode em sangue e violência na telona. Ou mesmo a aventura estradeira e lisérgica Sem Destino (1969), de Dennis Hopper. Apesar de não aparecerem no longa de Tarantino, são produções que apontam para um novo horizonte hollywoodiano.
SPAGHETTI
Curiosamente, a virada na carreira do personagem vivido por DiCaprio acena na Itália, com seus bang bangs de baixo orçamento e muita sujeira. Dalton tem o convite para trabalhar com Sergio Corbucci, famoso pelos faroestes à italiana.
Aliás, o país da bota é a terra natal de outro Sergio (Leone), que ficou famoso com a chamada Trilogia dos Dólares, estrelada por um então desconhecido ator norte-americano Clint Eastwood. De certa forma, o Dalton ficcional segue os passos de seu compatriota de carne e osso.
Em 1968, Sergio Leone lançaria a obra-prima Era uma vez no Oeste, um filme ítalo-hispano-estadunidense que reinterpreta os principais elementos do gênero western. Com Henry Fonda e Charles Bronson no elenco, essa produção joga luz na dinâmica dos antigos faroestes norte-americanos. Não por sinal, era uma vez está no título – assim como no novo Tarantino.
HISTÓRIA
Outro dado interessante em Era uma vez… em Hollywood é a forma como seu diretor recria a história – atenção, a partir de agora este texto contém spoilers.
Assim como já feito em Bastardos Inglórios (2009), Tarantino altera os rumos históricos. Naquele filme de dez anos atrás, o ditador Adolf Hitler era morto em uma cena épica; agora, a família Manson não consegue levar a cabo sua chacina.
Longe de qualquer tipo de incongruência, a solução dada por Tarantino é fantástica: ele desloca a ação, criando um lance de acaso que impede a chegada dos assassinos à mansão dos Polanski. Assim, as coisas só ocorrem em seu universo ficcional, ou melhor, tarantinesco.
Uma pena que Quentin Tarantino caminha para sua aposentadoria no próximo filme…